
Clio Operária
Todos nós somos filósofos
Atualizado: 6 de jul. de 2020
Rafael Lopes*

Todos nós somos filósofos, já diria Gramsci, mesmo que de forma inconsciente. Devemos largar os velhos jargões que limitam apenas a uma casta de intelectuais o papel de refletir e analisar o nosso mundo, mas isso não significa ignorar tudo o que vem dos intelectuais, pois eles para chegarem onde estão, passaram — ou deveriam ter passado — por um longo processo de aprendizagem. O que quero dizer é que todos nós somos capazes de nos tornamos intelectuais. O direito de ser intelectual não é exclusivo de certos grupos sociais e aceitar uma função predeterminada no mundo é dar razão a aristocracia da Grécia Antiga.
Não há ninguém predestinado a obedecer ou a mandar. Não aceitar funções predeterminadas é não cair nas falácias que dizem que apenas alguns setores da sociedade são capazes de refletir criticamente acerca do mundo. Mas o não aceitar as funções predeterminadas não é um simples cruzar de braços; precisamos ir além da desobediência, indo no caminho da organização e do pensamento critico, e para isso, esse agir filosófico deve sair do inconsciente.
Para Gramsci, há duas formas de pensar: de forma acrítica, ou seja, participar “de uma concepção de mundo imposta mecanicamente pelo ambiente exterior”, sendo essa concepção imposta pelas classes dominantes. Ou elaborar de forma crítica a nossa própria concepção de mundo, questionando os valores e predefinições. E para além disso, a nossa concepção de mundo tem que ser construída de forma crítica sobre aquela imposta pelas classes dominantes. Pois, quando a nossa concepção de mundo não é crítica, nos tornamos um aglomerado de preconceitos e conformismos acerca da nossa condição social no mundo. E mesmo após a construção de nossa concepção, devemos também levar a critica a ela, sempre refletindo sobre o nosso pensar. Não refletir de forma crítica significa fazer o jogo daqueles que utilizam de todos os instrumentos para nos manter na posição de produtores que não tem acesso a sua própria produção.
Já pensar de forma crítica significa refletir sobre as concepções impostas a nós, tornando a nossa concepção unitária e coerente. Com isso estamos contribuindo para a evolução do pensamento como um todo. Gramsci complementa:
(pensar de forma critica) Significa também, portanto, criticar toda a filosofia até hoje existente, na medida em que ela deixou estratificações consolidadas na filosofia popular. O início da elaboração crítica é a consciência daquilo que é realmente, isto é, um ‘conhece-te a ti mesmo’ como produto do processo histórico até hoje desenvolvido, que deixou em ti uma infinidade de traços acolhidos sem análise crítica. Deve-se fazer, inicialmente, essa análise.” (GRAMSCI)