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Antigo manicômio, atual lógica manicomial: uma breve narrativa sobre o Hospital Colônia de Barbacena

Há mais ou menos 100 anos, mais especificamente em 1903, a cidade mineira Barbacena recebia como prêmio de consolação por não ter sido eleita a nova capital do estado, o Hospital Colônia, o maior manicômio brasileiro. A cidade, no entanto, logo se satisfez com o presente de grego recebido, haja vista que a instituição fez com que as demais cidades, e até mesmo estados, voltassem os olhos à Barbacena como ponto de referência da psiquiatria mineira. Além disso, de acordo com a jornalista Daniela Arbex, o hospital serviu também como “um grande curral eleitoral”, onde a troca de votos por postos de trabalho tornou-se comum entre os políticos e moradores da cidade.
A lógica manicomial do Colônia não tardou a desembocar em resultados extremos: com capacidade para 200 leitos, o lugar chegou a contar com 5 mil pacientes, utilizando de medidas como a substituição das camas dos internos por capim, chamados de “leito-chão”, visando garantir espaço para a internação do maior número de pessoas possível. A catástrofe da institucionalização em massa foi um dos reflexos da aplicação da teoria eugenista que, somada ao anseio da burguesia pela contensão da indesejável população pobre e marginalizada, condenou todo aquele que desafiava a ordem vigente ou cujo modelo capitalista não encontrava funcionalidade ao confinamento nas prisões e manicômios do país. Em seu livro "Holocausto Brasileiro: vida, genocídio e 60 mil mortes no maior hospício do Brasil", Daniela Arbex revela essa realidade no Hospital Colônia:
Desde o início do século XX, a falta de critério médico para as internações era rotina no lugar onde se padronizava tudo, inclusive os diagnósticos. Maria de Jesus, brasileira de apenas vinte e três anos, teve o Colônia como destino, em 1911, porque apresentava tristeza como sintoma. Assim como ela, a estimativa é que 70% dos atendidos não sofressem de doença mental. Apenas eram diferentes ou ameaçavam a ordem pública. Por isso, o Colônia tornou-se destino de desafetos, homossexuais, militantes políticos, mães solteiras, alcoolistas, mendigos, negros, pobres, pessoas sem documentos e todos os tipos de indesejados, inclusive os chamados insanos (ARBEX, 2019, p. 25).